Paulo Moreira Leite
Está descoberta a solução para a tragédia dos cães violentos: mordeu, morreu.
Considerando-se que eles já atacaram crianças, ameaçam vizinhos, carteiros, passantes e ainda seguem desfilando pelas calçadas, é mesmo de perguntar: onde foi parar o pessoal da pena de morte? Eles acham justo matar gente, mas ficam quietos quando o crime foi cometido por um cão? Cachorros delinqüentes, por assim dizer, não podem continuar passeando por aí como se fossem preciosos bichinhos de estimação.
Considerando-se que se cobram 117 reais de quem não usa cinto de segurança, cuja única função é proteger o dono do automóvel, por que não cobrar multa dez vezes maior de quem deixa solta uma fera capaz de atacar uma pessoa que não tem nada a ver com isso?
Um cão não precisa arrancar sangue para se transformar num problema. Basta ameaçar, dar medo, que já estará ferindo a liberdade das pessoas.
O país anda com problemas demais – segurança, desemprego, trânsito – para ficar demonstrando cortesia e autocontrole com cachorros agressivos. Como se o problema estivesse em nós, as vítimas, daqui a pouco seremos obrigados a tomar novas lições de bom comportamento. Por exemplo: se você enxergar um cão agressivo se aproximando, mude de calçada. Se ele andar atrás, não corra. Se ele correr, fique quieto e não entre em pânico. Se nada disso funcionar, paciência: o dono promete que um novo ataque não vai repetir-se. Donos de cães agressivos nunca admitem que têm uma fera perigosa em casa. Sempre vêem o cachorro deles como um ente com características quase humanas.
Existe outra idéia no ar. É esta: vamos castrar os cães e a próxima geração será eliminada. Está bem. Pode funcionar. Mas, como se sabe, nem campanhas sanitárias para proteger seres humanos, como vacinação, alcançam todo mundo. Imagine-se no caso de cachorros.
A maioria das pessoas gosta de cães e faz muito bem. Eles são companheiros e brincalhões. Divertem os adultos e ajudam na educação afetiva das crianças. Não é desses animais que estamos falando, mas de feras agressivas que passeiam pelos supermercados, pelo parque num domingo, pela saída da escola. Tem gente que gosta de correr pelo bairro onde mora em companhia de um rottweiler – solto, muitas vezes.
Considera-se aceitável que uma pessoa corra o risco de ficar sem um pedaço da mão, da perna, ou mesmo sofra ataque ainda mais grave apenas porque o proprietário de um pit bull não está com vontade de prender sua gracinha? Porque um psicólogo de canil explica que um fila brasileiro tem direito à liberdade? Não é óbvio que o cidadão que acha razoável expor outro ser humano a um cachorro perigoso revela: 1) uma escala de valores anti-social; e 2) um distúrbio mental digno de urgência médica?
Está na hora de acabar com essa conversa de que um cão é apenas o reflexo do dono. Primeiro, porque isso não é verdade – se nem os filhos humanos são o retrato dos pais humanos, o que dizer dos cachorros. Segundo, porque esse raciocínio só serve para eximir os irresponsáveis de suas responsabilidades. Não se pune o dono porque quem atacou foi o cão. E se deixa o cão à solta porque quem precisa ser educado é o dono.
Com reportagem de Alexandre Secco, de São Paulo,
Ronaldo França, do Rio, e sucursais
http://veja.abril.com.br/140499/p_094.html
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